domingo, 6 de dezembro de 2015

Viva Marília!

Ela é herdeira direta da linhagem de Henriete Morineau, Dulcina de Moraes e Bibi Ferreira. Nascida numa família de artistas: pais, avós, tios. Seu pai, antes de ser ator de teatro e músico, foi artesão - alfaiate e carpinteiro de palco. Sua mãe, cantora e bailarina, foi estrela de teatro de revista. Desse modo, para Marília Marzullo Pêra, ser atriz talvez nem tenha sido uma escolha. Foi uma contingência. 

Nascida em 1943, ainda menina, já pisava os palcos como bailarina, espécie de preparação para uma carreira em que se revelaria uma artista completa: cantando, atuando e dançando. 

Em musicais de Broadway, sua estreia foi ainda no comecinho dos anos 1960 em Minha Querida Lady, ainda no coro, ao lado de Bibi Ferreira. Mas, claro, não pararia por aí. Ela esteve ainda na primeira montagem de Como Vencer Na Vida Sem Fazer Força (em que, dizem, ela teria desbancado Elis Regina), A Ópera de Três Vinténs, Pippin, Masterclass, Vitor ou Vitória, Hello Dolly e Gloriosa  – apenas para mencionar alguns. 

Marília com bailarinas do coro de Vítor ou Vitória. Abaixo: com Moacyr Franco e Bertha Loran em Como Vencer na Vida Sem Fazer Força; com Miguel Falabella em Alô, Dolly e, finalmente, com Marco Nanini em Pippin. 

Sua alma alegre e o temperamento perfeccionista foram perfeitos para dar ao teatro musical brasileiro o que ele precisava: a integração entre espontaneidade e técnica. Por isso, sua passagem por algumas das obras mais importantes do musical brasileiro tais como O Teu Cabelo Não Nega, Roda Viva, Deus Lhe Pague, Estrela Dalva e Elas Por Ela. 


Mas ela não ficou só no teatro musical. Ela fez da arte de representar seu ofício, independente de gêneros, estilos ou veículos. Seus personagens foram de Maria Callas, Carmem Miranda e Coco Chanel até a primeira dama Sarah Kubitscheck ou ainda a suburbana Darlene da recente sitcom Pé Na Cova. 

Como a estilista francesa Coco Chanel, a cantora Maria Callas, a primeira dama Sarah Kubitscheck
e em seu último papel, a deliciosa Darlene de Pé na Cova. 

No cinema e na TV, ela também atuou com conforto e precisão. Não se deixava aprisionar pela ditadura da câmera, do enquadramento. Atuava com plena voz e de corpo inteiro. Começou sua carreira em TV ainda nos anos 1960 e atingiu sucesso nacional em obras como Beto Rockfeller e Superplá (ambas da extinta TV Tupi). 
Marília Pera, Maria Della Costa e Luiz Gustavo em Beto Rockfeller;
com Othon Bastos em Superplá
(ambas da TV Tupi). Em Supermanuela (TV Globo)

Depois, já na Rede Globo de Televisão, seguiu uma trajetória de protagonistas inesquecíveis em obras como Uma Rosa Com Amor, Bandeira 2, O Cafona, Brega e Chique, Os Maias, JK e Primo Basílio.

Em cinema, apenas para citar e recomendar alguns filmes com interpretações absolutamente distintas e todas memoráveis, recomendamos Dias Melhores Virão, Bar Esperança, Tieta do Agreste, Anjos da Noite, Jenipapo, Central do Brasil e Pixote – seu grande êxito internacional, de crítica e público. 

Marília em Tieta do Agreste, ao lado de Cláudia Abreu. Com Hugo Carvana em Bar Esperança.
Em Pixote, de Hector Babenco. Com Rita Lee em Dias Melhores Virão. 

Recebeu todos os prêmios que uma atriz brasileira poderia receber. Para citar alguns: Molière, APCA, Mambembe, Air France, Governador do Estado, Shell, além de prêmios internacionais. 

Era uma atriz que revelava em seus trabalhos a preocupação com o humano, em revelar detalhes da alma humana. Seu apuro técnico e seu perfeccionismo estavam a serviço de sua sensibilidade e talento – e nunca o contrário.  Sabia a importância do estudo permanente e do constante aperfeiçoamento de sua arte. O Ensaio Geral dá Viva a Marília. 

Veja o vídeo abaixo. 


quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Raia 30 anos. Uma revista contemporânea.

Aos que me perguntam por que não escrevo críticas teatrais eu sempre respondo a mesma ladainha: porque amo demais o que faço e não pretendo parar, porque para ser um crítico é preciso entender muito do riscado e, finalmente, porque tenho amigos que são grandes artistas a quem dirijo minhas impressões na intimidade. Algumas vezes nem tanto... mas eles já me conhecem e compreendem esta minha franqueza e objetividade. Escrevo só, e sempre, quando gosto muito de algo e sou tocado de alguma forma. E quero escrever sobre Raia 30 anos.

Pode parecer, num primeiro momento, para um olhar menos avisado, um mero exercício de ego ou vaidade. E, ainda que fosse, nesta profissão, quem atira a primeira pedra? De um jeito ou de outro, todos nós buscamos o riso, a lágrima, o aplauso, a crítica, o prêmio... transformar ou tocar o outro – como se fôssemos deuses capazes dessa transformação na plateia.



E Claudia Raia em cena vai além da vaidade. Ela conta um sonho de menina, brinca com os desejos de adolescente, expõe a mulher do seu tempo, que vai à luta. É a diva, a deusa, a louca, a santa, a irônica, a extravagante, a kitsch, a moderna, a engraçada, a debochada, a abusada e a sincera. E, faz um verdadeiro exercício de revisitação do nosso teatro de revista mais popular. Muito mais graças ao entendimento profundo que Miguel Falabella tem desse tipo de estrutura e linguagem, do que pelo conhecimento que o diretor, José Possi Neto, parece ter. O espetáculo tem mais a cara (e parece ter a mão também) de homens como Falabella, Silvio de Abreu ou Jorge Fernando (também citados em cena) do que do próprio Possi.

E está tudo ali, as memórias e as histórias. Num grande espetáculo de revista – que a atriz chama de show. Com todos os elementos da revista: escadarias, colunas gregas e adornos art-déco, baldaquins, ribaltas, penachos, paetês, bananas, viadagem e sacanagem (não necessariamente nessa ordem). Tem número de plateia e de cortina, tem coristas e boys, e tem troca de roupa... como toda vedete merece.



E que se dane o ego da primeira atriz! Ela tem a capacidade de debochar de si mesma como poucas em nosso teatro, falando em primeira pessoa. Talvez como teve Dercy Gonçalves, que também mandava a opinião alheia à merda e sempre seguia em frente graças ao seu público.

E Cláudia não tem nem medo nem vergonha de se expor diante desse público. Não faz papai-e-mamãe. Manda ver! Franze o nariz quando fala de TV, embora saiba que é seu maior veículo. Fala palavrão, mas também diz palavrinhas doces sobre nossos antepassados artísticos. Fala de preconceito e de bunda à mostra na TV – usada e explorada como foi o corpo de Charity. Mas rindo disso!   

E evoca uma trajetória que se confunde com nosso musical contemporâneo. Num primeiro quadro, como num tableau vivant – tão comum nas antigas revistas – surgem seus fantasmas: a mãe e a irmã, seus personagens mais emblemáticos, um Walter Clark que se confunde com Tonhão, figuras saídas de coreografias de Fosse e Lenny Dale (este, num dos momentos mais tocantes do espetáculo). Talvez seja esta a grande contribuição de Possi: a poesia, a elegância e o glamour. 

A direção musical é esperta e ampara o elenco criando condições para que todos cantem com conforto e, em especial, a protagonista. Somada às novas letras escritas por Miguel, o resultado sonoro é divertido, alegre, e emociona quando necessário – apesar de alguns problemas de equalização de instrumentos, bases e microfones (pelo menos quando vi). Vale mencionar a criação de uma overture muito agradável para ser ouvida durante as sempre maçantes projeções iniciais.



Ao lado de Claudia, um elenco delicioso de jovens atores e bailarinos muito bem orquestrados por Tania Nardini em coreografias de inspirações diversas, mas sobretudo em Bob Fosse. E, claro, Marcos Tumura. Um dos artistas mais competentes do nosso musical, no que diz respeito a cantar/dançar, mas sobretudo atuar suas canções, evocando um MC camaleônico, mas com identidade sempre presente.

De resto, o que não é resto! Os figurinos sempre muito cuidadosos e competentes de Fábio Namatame aliados à luz de Drika Mathes criam todos os ambientes necessários e evocam as inúmeras referências que o roteiro e a direção impõem.

Defeitos? Tudo tem defeito. Eu, você, até minha mãe tinha. Mas felizmente não estou fazendo uma crítica. Estou falando de amigos. Publicamente rasgando seda.  


quinta-feira, 6 de agosto de 2015

12 musicais que foram parar na tela, telinha, telona!

Comecei a gostar de musicais antes de saber que havia um teatro musical. Comecei a gostar de musicais vendo os filmes da Sessão da Tarde, com minha mãe. Todas aquelas produções sensacionais, grandiloquentes, da MGM e da Paramount. Musicais com Fred Astaire, Ginger Rogers, Ann Miller, Gene Kelly, Judy Garland, Mickey Rooney, Tony Randall, Marilyn Monroe, Cyd Charisse... e tantos outros e outras. Puro entretenimento e escapismo. 

De cima para baixo, da esquerda para direita.
Cartazes de O Picolino e Vamos Dançar?  (Fred Astaire e Ginger Rogers);
Marilyn Monroe e Jane Russel em Os Homens Preferem as Loiras.
Frank Sinatra e Gene Kelly em On The Town (Um Dia em NY)
Cid Charise e Gene Kelly em Singing in the Rain (Cantando na Chuva)

Depois vieram os filmes de Elvis Presley e as comédias musicadas de Jerry Lewis e Dean Martin. Tudo isso formou e formatou meu gosto por narrativas que entrelaçavam a dramaturgia/roteiro com as canções e coreografias. E não me perguntem como eu – um garoto de 10 anos de idade – entendia os números cantados em inglês. Porque eu não os entendia!

Em cima: Shirley MacLaine, Jerry Lewis, Dorothy Malone e Dean Martin em Artistas e Modelos (Artists and Models - 1955)
Embaixo: cartaz e cena de Feitiço Havaiano. 
O fato é que, mais tarde (muito mais!), fui descobrir o teatro musical. Em espetáculos como Chiquinha Gonzaga – Ó Abre-Alas ou O Poeta da Vila e Seus Amores (sobre Noel Rosa), ambos no Teatro Popular do SESI. Muito antes de madrinhas de pileque ou sonhos impossíveis.

Bem... tudo isso pra dizer que, quem ama musicais, os ama de qualquer jeito: no palco, na rua, na telona ou nas telinhas do Youtube. E é por isso que o vídeo abaixo lista 12 títulos de cinema musical que você precisa ver. Alguns nasceram no palco e foram para as telas... Outros fizeram o caminho inverso. Outros, ainda, nasceram e ficaram só no cinema.

Não estão organizados sob nenhum critério. Peguei-os aleatoriamente na minha prateleira de DVDs e saí falando pra câmera. Mas acho que o resultado ficou bom. De Rent a Bodas de Sangue, ou de Hello Dolly a Nine, trata-se de um passeio por alguns dos meus favoritos.

Veja o vídeo e divirta-se!





quarta-feira, 22 de julho de 2015

Uma franquia chamada Família Addams.

Quando o cartunista estadunidense Charles Addams criou a bizarra e soturna Família Addams como crítica à crise socioeconômica pela qual os Estados Unidos passavam naqueles anos 1930, ele não imaginava que o retrato dessa família disfuncional iria durar tanto se ser multiplicado por tantas e tão diferentes mídias. Do cartoon aos desenhos animados, do cinema aos palcos dos musicais da Broadway.
Sobre isso, escrevi em 2013 um artigo bastante esclarecedor e divertido ao mesmo tempo. Nele, eu falo de como a imagem da família se torna um ícone preservado e multiplicado por décadas até chegar aos musicais da Broadway - inclusive na franquia brasileira da T4F. Pra você que é fan dos Addams, vale assistir o vídeo abaixo e depois clicar no link do artigo. 




Ah! E se for utilizar a minha pesquisa de alguma forma, não se esqueça de dar o crédito e mencionar a referência! 

terça-feira, 7 de julho de 2015

O sonhado Gigolô de Falabella.

Em seu livro How Musicals Work (and how to write your own), o inglês Julian Woolford, logo de cara, informa seus leitores de que são raros os musicais originais. Eles sempre se baseiam em alguma outra obra. Também sobre isso, nos alerta a Diretora Musical de Urinal, Fernanda Maia, em entrevista publicada aqui no Ensaio Geral e no nosso Canal do YouTube.



Desse modo, é até um exercício gostoso ficar pensando em que obras alguns musicais se basearam. Por exemplo: O Rei Leão é o Hamlet, Kiss Me Kate é a Megera Domada, Wicked nasceu de O Mágico de Oz, Miss Saigon é Madame Butterfly, Rent e Moulin Rouge são La Bohème e por aí vai. Isso, sem esquecer aqueles que são adaptações diretas a partir de livros ou filmes: Nine To Five, Ghost, Les Misèrables. Ou os brasileiros Se Eu Fosse Você, Bilac Vê Estrelas ou o recente Memórias de um Gigolô.



Este último, uma adaptação (e direção) há muito sonhada por Miguel Falabella a partir do original de Marcos Rey (1968). Mas a adaptação não é o primeiro exercício de transposição de linguagem feito sobre a obra literária de Rey. Antes, ele já foi filme (1970) sob a direção de Alberto Pieralisi e minissérie da TV Globo (1986). O musical de Falabella tem composições de Josimar Carneiro, o mesmo que fez com ele Império.

Nessa praia, até telenovelas já estão inspirando musicais. Vem aí Vamp, inspirado na teleobra de Antonio Calmon e o produtor Marllos Silva promete ainda para 2016 uma adaptação binacional de A Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães.

Quer saber mais sobre Memórias de Um Gigolô? Dê uma olhada no nosso vídeo, aqui embaixo!
Ah! E não se esqueça de comentar este post e compartilhá-lo em suas redes sociais.


sexta-feira, 3 de julho de 2015

Chaplin é teatro, antes de ser musical.

Durante anos, Charles Chaplin brigou pelo direito de permanecer mudo na tela. Um dia, diante da opressão, ele falou. E nunca mais se calou. Depois disso, passou anos lutando pelo direito de continuar falando. Mas, então, finalmente, foi obrigado a se calar. Exilado e, depois, recluso na Suíça – neutro como aquele país – Chaplin não se dizia comunista, mas sim humanista.


Pelo menos essa é a visão que a biografia musical que leva seu nome procura dar do retratado. Antes de tudo, um artista. Pela mais completa falta de opção. Um artista, pela mais arguta observação da vida cotidiana e da alma humana, das idiossincrasias e ironias que cercam o homem comum: bêbados, mendigos, floristas de calçada, párias, ladrões e policiais, donos de mercearias, ricaços esnobes. Essa foi a matéria-prima de seus filmes. E é o que se vê em cena.

Chaplin – O Musical não um é espetáculo para toda a família. É um espetáculo para todas as pessoas. Especialmente aquelas mais jovens, que não viram seus filmes na TV ou nas antigas coleções de videocassetes dos anos 1980. Alguns nem sequer ouviram falar dele antes do musical. A esses, recomendo que vejam a peça com um caderninho de anotações para ver, no mínimo, filmes como: Tempos Modernos, O Grande Ditador, Luzes da Cidade e Luzes da Ribalta.  

Alguns filmes de Chaplin em sentido horário:
Tempos Modernos, O Garoto, Luzes da Cidade e O Circo. 

É a chance de ouvir um trecho do famoso discurso de O Grande Ditador, ver os velhos e lindos cartazes de seus filmes (sempre pinturas que se tornaram verdadeiras obras de arte). A oportunidade de saber que dançar com o globo terrestre não era prerrogativa de uma oportunista abertura de novela. Saber que ele foi o primeiro artista de cinema a se produzir (ao lado de Douglas Fairbanks e de uma esquecida Mary Pickford). Significava ser dono de seu trabalho e consequentemente arcar com prejuízos ou receber os lucros.


Fundação da UA-United Artists.
Da esquerda para direita: DW Grifith, Mary Pickford, Chaplin e Douglas Fairbanks.

É um musical, sim. E apesar das bonitas canções (algumas delas rapidamente esquecíveis), o que fica é a lembrança das belas vozes em alguns números de forte impacto sonoro e visual, especialmente os conduzidos por Naíma, Paula Cappovilla, Giulia Nadruz e, claro, Homem de Mello. Este, um ator cada vez mais envolvido com a importância teatral da obra cênica – agora também como produtor. 

Jarbas Homem de Mello, como Carlitos. Paulo Goulart Filho como Mack Senett.
Marcelo Antony como Sid Chaplin. Paula Capovilla como Hedda Hopper.
 Naíma como Hannah, a mãe de Chaplin. 

Nesta montagem, que parece mais centrada, equilibrada e até econômica - num bom sentido - que a da Broadway (sem certas histerias típicas daquele teatro), a  beleza do espetáculo está para além da música. Ela se estende pelos figurinos sempre cuidadosos de Fábio Namatame e por um verdadeiro espetáculo de luz e cores, profundidades e dimensões – sem nunca deixar de lado a essencialidade, a sensação de que o show não pode ser maior que a obra. Além de um elenco afiadíssimo que conta ainda com Paulo Goulart Filho, Marcelo Antony e um competente grupo de artistas completos.

Veja Chaplin, O Musical não por ser um musical. Aliás, não vá esperando um musical desses de franquia, com excessos de americanismos e lantejoulas. Vá para ver teatro. Bom teatro. Que por acaso é musical.

Abaixo, você vê a entrevista que o Ensaio geral fez com Homem de Mello. 





domingo, 28 de junho de 2015

Uma puta chamada Saraghina

Sabe o que é uma personagem emblemática? É aquela que representa mais do que simplesmente seu papel: ela carrega um pensamento, um lema, uma ideia, o conceito de uma obra. Assim é a puta Saraghina de Nine, que representa o universo que nos habituamos a conhecer por Felliniano. Um universo evocado em Nine.  


Ela, sim, é felliniana. Opulenta, grande e impressionante. Ela faz parte do imaginário de um homem-menino que busca a mulher ideal, a musa. É uma puta de praia. É gorda, tetuda, coxuda. Escandalosamente descabelada. Desbragadamente sedutora. Ela é Saraghina.



Em 8 1/2 de Fellini (1963), ela ocupa o lugar de destaque por ser e estar na contramão da beleza de afrodite. É dionisíaca, demoníaca e, por isso mesmo, sedutora. No filme, ela foi vivida pela americana Eddra Gale.


Depois, o filme foi adaptado para o teatro. Virou um musical (1982) tendo Raul Julia no papel central. Na transposição, muito se perdeu, mas a puta Saraghina foi junto. Na primeira montagem da Broadway, ela foi vivida por Kathi Moss. Aqui vai uma foto dela.



Na sequência (2003), um Revival, tendo no elenco: Antonio Banderas, Chita Rivera e Laura Benanti. Desta vez, a opulência agressiva de Saraghina foi vivida pela maravilhosa atriz (negra, inclusive!) Mary Lucretia Taylor, de quem se tem poucos registros. Veja aqui um trecho de Be Italian numa filmagem amadora.



Daí veio o filme (2009). E Daniel Day Lewis precisava se lembrar de uma Saraghina mais hollywoodiana. E, apesar da paisagem em preto e branco de uma praia da infância... dos ecos de Fellini que a filmagem trazia, Fergie estava longe de ter o tom grotesco que Saraghina exige. Opulenta, sim. Mas glamurosa, E meio distante da Saraghina imaginada originalmente.



Finalmente chegamos à total glamurização. Na montagem brasileira de Nine - um musical que leva o subtítulo de felliniano (2015), Saraghina tem cinturinha de vespa, bracinhos finos e cara de menina. A atriz Myra Ruiz é excelente e canta divinamente a canção que lhe foi incumbida. Mas é tão jovem, linda e angelical que não tem o peso, a violência, a selvageria e a maturidade necessárias para o personagem. Me faz sentir falta da puta que assustava e seduzia o garoto e que, de alguma forma, o fez ser o homem que está ali representado em tamanho conflito existencial.


P.S. Aproveite para rever aqui o vídeo que o Ensaio Geral fez sobre Nine, Um Musical Felliniano.

domingo, 7 de junho de 2015

Entrevista: Fernanda Maia

Em 2013 eu entrevistei Fernanda Maia para a produção do livro A Broadway Não é Aqui (a ser lançado). Ela contou a história de como uma pianista de formação erudita foi parar no palco, se tornou atriz e, depois, Diretora Musical premiada em alguns dos espetáculos mais bem cotados dos últimos anos, incluindo Urinal, O Musical.

Fernanda Maia fotografada por Ronaldo Gutierrez

Fernanda Maia, além de musicista, diretora musical e atriz, é ainda dramaturga e produtora de alguns premiados espetáculos musicais para crianças: Menino Lua, Canção de Amor em Rosa e Chovendo na Roseira.

Rodrigo Caetano, Cy Teixeira e Felipe Ramos em Menino Lua. Foto de Ronaldo Gutierrez

Mas se você pensa que a entrevista (editada em dois blocos de pouco mais de 20 minutos) parou por aí, engana-se. Fernanda fala de musicais de Broadway, revela suas preocupações com políticas culturais e administração pública, além de dar valiosas dicas para quem quer continuar nesse mercado de trabalho.

Luciana Ramanzini, Helena Ritto, Jon Faria e Caio Salay em Chovendo na Roseira. Foto de Ronaldo Gutierrez.

Abaixo, você fica com  entrevista em dois blocos. Fique de olho e saiba mais. E, claro, curta nossa página no Youtube e no Facebook para saber tudo antes.




quarta-feira, 27 de maio de 2015

A Visita de Chita Rivera

Algumas coisinhas sobre o musical The Visit (baseado na peça de Friedrich Dürrenmatt, A Visita da Velha Senhora), atualmente em cartaz na Broadway com a emblemática Chita Rivera no papel de Clara Zachanassian.



A peça, com libreto de Terence McNally e composições da dupla Kander & Ebb (falecido em 2004), estreou no ano de 2000 e foi criada originariamente para Angela Lansburry... que não estreou, sendo substituída por Chita numa montagem que ficou entre Boston e Chicago, não tendo estreado na Broadway - devido aos ataques das Torres Gêmeas (o popular 11 de Setembro).

John Kander e Fred Ebb. Foto: The Old Globe.

Uma nova montagem em 2008, desta vez em Arllington (Virginia) trouxe Rivera novamente no papel. Em 2011, Rivera mais uma vez cantou num The Visit In Concert para, finalmente, neste ano de 2015 brilhar na Broadway e justificar a mais que merecida indicação ao Tony de Melhor Atriz em Musicais.



Dizem as más línguas que a peça não vai bem. Mas outros (as boas línguas) contam que Chita, grande amiga de Liza Minelli, ao entrar em cena é ovacionada num papel que marca definitivamente seu lugar como grande estrela latina da Broadway.

Em artigo publicado no USA Today, Liza Minelli afirma que esta montagem marca o fim de uma era na Broadway. Especialmente porque trata-se da última criação de uma dupla que agora sente a falta de Fred Ebb - uma parceria que durou mais de 40 anos. Ela diz:


"seu trabalho viverá em remontagens até o fim dos tempos, claro, 
mas a emoção e o privilégio de ouvir suas palavras e música cantadas 
em alto e bom som pela primeira vez é uma experiência singular." 



Quanto a nós, do Ensaio Geral, resta-nos esperar que a peça fique muito tempo em cartaz para que mais e mais pessoas possam ver Chita Rivera em cena em pleno coração de Nova Iorque - a Broadway.



sábado, 23 de maio de 2015

Entrevista: Jarbas Homem de Mello

Ele é um verdadeiro camaleão a serviço de sua arte. Canta, dança, atua... e entende do que faz.
Em 2012 entrevistei o ator, cantor e bailarino Jarbas Homem de Mello. Na época ele fazia brilhantemente o Emcee da montagem de Cabaret, produzida e protagonizada por Cláudia Raia. Foi um papo com mais de 2 horas que resultou numa entrevista editada de 30 minutos.

Jarbas Homem de Mello e Cláudia Raia em Cabaret. Foto: divulgação. 

De lá pra cá, ele sapateou sua alegria em Crazy For You - em que brilhava como comediante e bailarino - e estreou recentemente Chaplin, O Musical, agora sem a companhia de sua parceira mais constante dos últimos anos, La Raia.

A dupla em Crazy For You. Foto: Francisco Cepeda. 
Mas em Chaplin ele continua muito bem acompanhado, ao lado de Naima (com quem já fizera Zorro), Paula Capovilla (amiga e parceira de longa data) e o global Marcelo Antony. Chaplin conta com uma ficha técnica de fazer inveja... mas não é o assunto nem deste post e muito menos da entrevista.

Jarbas Homem de Mello, como Chaplin. Ao lado de Paulo Goulart Filho e Marcelo Antony.
Paula Capovilla e Naíma. Foto: divulgação. 


No papo que você vai ver no vídeo abaixo, Jarbas fala dos primeiros anos de carreira, sobre a experiência nos musicais de franquia, teatro de revista, sua visão sobre o musical brasileiro e muito mais. Uma verdadeira aula!






Aqui vai a segunda parte da entrevista de Jarbas Homem de Mello. 
Se curtiu, deixe seu comentário! E faça sugestões de mais entrevistas. 





terça-feira, 12 de maio de 2015

10 coisas que sei sobre Urinal

Muito tem se falado sobre Urinal - O Musical.  E têm surgido muitas discussões bem interessantes sobre a peça, a montagem, o texto etc. E essas conversas levam a questionamentos, dúvidas e perguntas até frequentes.

Acredito que algumas dessas perguntas serão sempre melhor respondidas se feitas ao diretor do espetáculo e à diretora musical, Zé Henrique de Paula e Fernanda Maia, respectivamente. Mas acho que há uma coisinha ou que o Ensaio Geral pode adiantar:


Elenco de Urinal. Foto:Ronaldo Gutierrez
1 – O nome original é Urinetown, portanto a tradução para Urinal é ideal em sentido e, principalmente, do ponto de vista da versão musical (com as tônicas perfeitamente adequadas à partitura da canção-título).

2 – Urinetown é um uma comédia musical americana, que nasceu para o Fringe em 1999 e chegou ao Off-Broadway em 2001, ganhando o mainstream da Broadway ainda no mesmo ano. Daí seguiu carreira em tours pelos Estados Unidos e indo para Londres. Conta o autor do libreto, Greg Kotis que a origem da peça está numa viagem que ele fez a Paris quando estudante. Lá, se viu obrigado a pagar pelos banheiros públicos da cidade. A pergunta veio logo à sua cabeça: e se não houvesse banheiros particulares e esses banheiros públicos estivessem nas mãos das grandes corporações?

 Fábio Redkowikz, Thiago Ledier, Bruna Guerin, Gerson Steves, Daniel Costa e Roney Facchini Foto:divulgação


3 – A obra é uma sátira aos musicais tradicionais, mas também um alerta em tempos de crise: estamos, sim, nas mãos das grandes corporações e até mesmo aquilo que antes nos pareceria gratuito ou um bem comum - como a água ou alguns direitos básicos - hoje nos é cobrado. Se pensarmos bem, já pagamos mais por um litro de água do que por um litro de gasolina!

4 – São muitas as referências aos musicais conhecidos de todos nós.  Especialmente por ser um metamusical com origens nítidas no cabaré alemão e no teatro de Bertolt Brecht e Weill - tanto na dramaturgia quanto na música. Assim, a peça brinca com obras que vão desde a Ópera de Três Vinténs até musicais mais contemporâneos como Les Misèrables, West Side Story, Evita, Sweeney Todd e muitos outros.

5 – Diferentemente de obras como Chicago ou Cabaret que possuem números que comentam a ação cumprindo funções dramáticas e narrativas, em Urinal as canções são muito mais dramáticas (no sentido de  “empurrarem a ação para frente”), até porque a função narrativa está na boca do narrador da peça – o Policial. Em Urinal, se as canções forem extraídas, a peça fica quase impossível de ser compreendida.

6 – Urinal é um musical muito compacto, especialmente em seu libreto. As cenas de diálogos são rápidas, algumas até telegráficas. Isso deixa para as canções (dos mais diferentes gêneros e estilos) a importante tarefa de contar a peça.


Caio Salay, Thiago Carreira, Adriana Alencar, Bia Bologna, Luciana Ramanzini, Paulo Marcos Brito e Nabia Villela.
Foto: Ronaldo Gutierrez

7 – Todo cenário da montagem nacional, bem como seus figurinos – ambos assinados por Zé Henrique – são produzidos a partir de reaproveitamento de materiais e peças de acervo rearranjadas para atender às necessidades dessa encenação.

8 – A direção musical apostou numa sonoridade mais acústica, por assim dizer, e os cinco músicos em cena, do mesmo modo que os 14 atores, não estão amplificados para a plateia. O que se ouve é um resultado mais humano, com uma diversidade de corpos e vozes que podem ser expressivos sem aquele som metálico que às vezes é comum em teatro musical.

9 – Zé Henrique de Paula e Fernanda Maia já estudavam a obra há alguns anos, trabalhando e retrabalhando as versões (com supervisão de Cláudio Botelho). Experimentaram possibilidades numa montagem com alunos, até chegarem ao momento presente em que a crise hídrica por que passa a cidade fez com que a urgência da encenação se impusesse.  


Gabriel Malo, Inês Aranha, Fernanda Maia e Zé Henrique de Paula. Foto: divulgação Portal R7

10  Urinal foi ensaiada em 10 semanas. Nas primeiras três, os diretores e os preparadores corporais e coreógrafos (Inês Aranha e Gabriel Malo) preferiram que o elenco estudasse profundamente a parte musical antes de entrar de sola na fase de “levantar cenas”. Já na terceira semana, começaram os exercícios de construção física de personagens conduzidos por Inês e os primeiros passos (literalmente) de coreografia. Logo em seguida, Zé Henrique começou a levantar as cenas. Na oitava semana, o elenco já fazia ensaios corridos. 



sábado, 9 de maio de 2015

Oito e meio... Nove!

Em alguns dias, estreia mais uma franquia musical vinda da Broadway. E, mais uma vez, dirigida pela dupla Möeller & Botelho. Trata-se de Nine - Um Musical Felliniano. Se você é jovem, não é lá muito fan de cinema e é um apaixonado por musicais, talvez não saiba que Nine leva esse subtítulo só aqui no Brasil. E, isso, por conta de suas origens que nos levam a muito antes dessa ideia de que o título da peça é por conta das mulheres que cercam o protagonista Guido.

Algumas das estrelas da montagem brasileira de Nine - Um Musical Felliniano

Há muitas histórias por trás desse musical cuja ideia original nasce em 1973 como um produto escolar de Maury Yeston. Mais tarde, Yeston une suas canções ao libreto de Arthur Kopit e produz, em 1982, este musical que tem sua origem em um filme de Federico Fellini de 1963. 
Capas das edições do Playbill de Nine. À esquerda da montagem de 1982 e, à direita, do revival de 2003. 

De lá pra cá, após um revival e alguns prêmios Tony, Nine chega aos cinemas numa produção dirigida por Rob Marshall em 2009 e com um elenco estelar.  Quer saber mais sobre as origens de Nine antes de ver o montagem de Möeller&Botelho? Então assista este vídeo que o Ensaio Geral preparou só pra você!